Perícia feita no Inep indica fragilidades no processo de pontuação de provas do Enem 2016
Postado em
23/07/2018
Uma perícia realizada no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) analisou avaliações do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2016, realizado em duas datas, e constatou fragilidades no processo de pontuação das medidas da prova.
O motivo da perícia, contratada pelo Ministério Público Federal (MPF) em Uberlândia (MG) após ação judicial, foi verificar se o fato de as duas aplicações do Enem 2016 terem números muito diferentes de candidatos influenciou no resultado final, e se isso prejudicou os alunos da segunda aplicação.
Em 2016, por causa das ocupações estudantis, o exame foi aplicado duas vezes: a primeira em 5 e 6 de novembro, com a participação de 5,8 milhões de alunos, e a segunda em 3 e 4 de dezembro, em que fizeram as provas menos de 170 mil candidatos.
Em nota, o Inep informou ao G1 que não foi notificado oficialmente sobre qualquer resultado a respeito da perícia, que foi realizada entre os dias 5 e 9 de fevereiro deste ano, nas dependências do instituto.
"O Inep conta com a consultoria de diversos especialistas de destacada atuação em análise estatística e psicométrica de avaliações e exames em larga escala e tem total segurança quanto à metodologia que, desde 2009, é adotada no Enem - reconhecida nos âmbitos nacional e internacional, e se pronunciará quando for devidamente notificado", diz o texto.
"Vale registrar que, independentemente do seu conteúdo, o referido laudo representa uma opinião isolada", concluiu a assessoria de comunicação do instituto.
Resultado da perícia
A perícia foi realizada por Tufi Machado Soares que é professor do Departamento de Estatística e do Programa de Doutorado e Mestrado em Educação, e coordenador da Unidade de Pesquisa do Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação (Caed) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
O perito, que atuou como membro do conselho científico do Enem e é especialista em Teoria da Resposta ao Item (TRI), metodologia usada no exame, teve acesso a informações sigilosas no Inep e produziu um laudo com 207 páginas.
Neste documento, enviado à reportagem pelo MPF, o perito relata fragilidades no processo de pontuação das medidas do Enem que poderiam prejudicar a comparabilidade dos resultados produzidos para duas provas diferentes.
No laudo, os pontos de fragilidade encontrados, por ordem de importância, foram:
- Número de itens comuns previamente calibrados nos pré-testes e fixados na prova regular do Enem;
- Tamanho das amostras de calibração em alguns pré-testes;
- Precisão com que os resultados do Enem são reportados ao público;
- Ausência de informações para o público sobre a qualidade dos testes e das medidas.
Além disso, o laudo mostra que ambos os testes nas disciplinas de Ciências Humanas e Ciências da Natureza apresentam mesmos níveis de precisão em praticamente todos os níveis de proficiência. Nesse sentido, então, os testes foram praticamente equivalentes, embora a prova da segunda aplicação de Ciências da Natureza tenha sido um pouco mais fácil.
O perito diz no texto que a maioria das diferenças encontradas ocorreu nas disciplinas de Linguagens e Códigos e na de Matemática, sendo que na primeira houve vantagem dos candidatos da 1ª prova e, na segunda, dos candidatos da 2ª prova. As menores diferenças observadas ocorrem em Ciências da Natureza.
No entanto, o Tufi Soares ressalva que não é possível realizar uma análise de comparabilidade para todos os casos, individualmente, nas dimensões do Enem.
Próximos passos
O procurador da República, Leonardo Macedo, responsável pelo inquérito civil que apura irregularidades referentes à adoção de diferentes critérios de correção das provas do Enem 2016, informou que encaminhou o resultado da perícia para o Inep e para estudantes que manifestaram que foram lesados pelo teste.
"O laudo é extenso e não tem uma conclusão única. O primeiro passo foi encaminhar essa perícia aos principais interessados e vamos dar um prazo para análise de todos. Depois disso, vamos marcar uma audiência pública onde todos poderão colocar o ponto de vista referente ao assunto e só depois o MPF vai analisar como agir", explicou o procurador.
Segundo o MPF, ainda não há previsão para realização desta audiência. "Estamos lidando com um elefante de porcelana. Vamos agir com cautela e, depois da audiência, analisar se vamos pedir uma indenização, aumentar a nota de estudantes ou outras opções", concluiu Macedo.
Aplicações do Enem
Normalmente, o adiamento do Enem ocorre todos os anos, mas afeta apenas alguns milhares de estudantes, por motivos externos que impedem a aplicação do exame, como queda de energia no local de provas. Nesses casos, os candidatos ganham o direito de participar de uma nova aplicação durante a semana. É a mesma prova para pessoas privadas de liberdade, por isso a aplicação é conhecida como Enem PPL.
Em 2016, porém, a onda de ocupações estudantis em escolas públicas em 23 estados e no Distrito Federal fez o Ministério da Educação adiar a aplicação do Enem para mais de 270 mil candidatos, o que inviabilizaria uma segunda aplicação durante a semana. Por isso, o Enem 2016 teve três aplicações. Na época, o Ministério da Educação (MEC) assegurou que haveria isonomia nas avaliações dos candidatos, independentemente do momento em que fizessem as provas.
Apesar do grande número de candidatos afetados pelo adiamento, o total deles representou menos de 5% dos mais de 8 milhões de inscritos. Na primeira aplicação, pouco menos de 6 milhões de candidatos fizeram as provas, com uma abstenção de 30%. Já na segunda aplicação, do Enem adiado, a abstenção subiu para 40%.
Fonte: G1
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